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quarta-feira, 13 de novembro de 2013

CASEIREANDO


Um vento frio entrou pela fresta do galpão acordando o rapazinho. Além de ter dormido mal naquela noite, devido a umas histórias de assombro que se comentava sobre a casa, mais aquilo ainda. Sempre que pousava fora de casa era assim. Quis se aborrecer, mas se deu conta que já estava na hora de deixar as cobertas.
Veio dormir ali porque os donos da casa e os empregados iam sair cedo. Na cidade iriam pra festa de formatura de um dos filhos e ele ficaria caseireando.
A filha caçula dos donos da casa, quando estudava com ele na escola, até que trocavam olhares. Não chegava a ser namorico, mas um calorzito dentro do peito era sentido. A guria era bonitinha e safada, dava umas linhadas pra ele, porém ele sabia que sendo filho registrado só no nome da mãe e mulato, estava descartado qualquer namoro, apesar de ser gente boa. Essa gente mais antiga dava muita importância pra isso.
Passou os dias em roda de casa. De vez em quando puxava a gaita de boca do bolso, soprava algumas notas sem formar música, o que era contestado pelo uivo de um cusquinho mimoso. Aquilo foi repetido várias vezes. Ele achava engraçado o cusco uivar com o pescoço bem espichado e de olho fechado. Se o toque se prolongasse muito, o mijo do animalzinho escorria no terreiro.
Foi recomendado que a boia do cachorro que estava atado era pra atirar de longe. Não facilitasse com o Tufão. Se chovesse, recolher os queijos. Tomasse sentido também que de vez em quando um gato aparecia pra pegar pinto. Se aparecesse algum estranho não falasse muito e dissesse que o patrão estava no vizinho.
Na hora de dormir, apagar bem o fogo. Que afastasse bem os tições...
A noite não é igual quando se dorme fora. A responsabilidade de cuidar da casa e uma sensação estranha, pra não dizer medo, fazia com que o sono não chegasse. Chegou até a tapar a cabeça. Será que os assombros se manifestariam? Depois de muito se revirar, pegou no sono. Parece que não deu tempo de sonhos, ou não se lembra se sonhou, o fato é que o dia vinha chegando. O canto do galo parecia longe, porém quando destapou a cabeça...
Assim passou o sábado e o domingo. Uma laranja de vez em quando, daí a pouco uma bergamota...
Na segunda de manhã, o caseiro se preparava pra tirar leite quando ouviu o rumor do carro da família que voltava. Tufão parecia que ia rebentar a corrente. Maneou a vaca e foi abrir a porteira.  Será que a caçula não viria junto? Pois não veio. O rapazito ajudou a descarregar a caminhoneta e voltou pra mangueira.
Entregou na porta um balde espumante de leite. Foi convidado a entrar.
Na cozinha, depois de um bom café, a patroa lhe presenteou com uma bombacha castelhana e mais umas caixas com salgadinhos da festa, além de uns bons trocados e elogios de que tudo estava bem.
- Então até outro dia! Quando precisarem estarei pronto!
Assim, pegou o chapéu, a estrada e de vez em quando abria o pacote pra espiar a bombacha nova.


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