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quinta-feira, 29 de maio de 2014

BARRANCOS DA SAUDADE






A antiga estrada barrancosa guarda no seu leito, a lembrança do vai e vem de carretas, de piás em seus petiços rumo à venda ou à escola, de mulheres com suas sombrinhas e miúdos ao colo, nas tardes quentes, para rezar os terços dos falecidos, da aranha que conduzia  parteira levando a cegonha, de tauras bem encilhados pacholeando, indo ao encontro das prendas ou para um comércio de carreiras. Enfim, até mesmo dos cuscos.

O coqueiro que lhe empresta o nome continua esguio, resistindo às investidas das tormentas, agora sem o emaranhado de pauzinhos do ninho das “caturras”.

A timbaúva quase centenária, palco das sesteadas, espichou seus tentáculos sobre o vão do leito quase coberto de pés de vassouras e caraguatás, alcançando o outro lado, cutucando a tabatinga do barranco vermelho/amarelado, de onde o pá habilidoso raspava o barro nos dias de chuva para moldar vaquinhas, cavalinhos, bonecos para a mana...

Alguns pés de cambarás ainda debruçam seus galhos sonolentos projetando sobra rala. Uns e outros tocos que foram um dia palanques de lei e mirantes de corujas despontam nas macegas, qual dentes quebrados pelos desastres do percurso nas churrascadas da vida.

As cargas de bagaço da cana moída, as quais entupiam as valetas da erosão, não fazem mais parte do cenário daquele hoje velho caminho vicinal.

Os joãos-de-barro buscam a matéria prima para construção dos ranchos em outras barreiras. Um tatu “macaieiro”, fez sua toca no emaranhado de raízes das aroeiras, num dos barrancos e mora por lá vizinhando com um lagarto, visto que a cachorrada já não é mais aquela de faro aguçado e buena de canela.

À noite, o vento, único transeunte, percorre a velha estrada. Tal como o carreteiro do passado, assobia uma canção sem início, sem meio e sem fim.

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