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segunda-feira, 29 de abril de 2019

ESPIANDO O NATAL



Numa manhã de Natal
a criançada se ergueu cedo
ansiosas pelos “binquedos”
que o Papai “Nonel” deixou
a folia das crianças
contagiava a estância
mas teve um que não achou

Foi o filho do peão
que lá do seu rancho pobre
onde a escassez dos cobres
convive no dia a dia
da moldura da janela
espiava toda a trela
e a pompa da mordomia

Nunca se queixou por pobre
foi guri criado assim
e sua infância enfim
não foi ele que escolheu
e aquela mini figura
que espiava na moldura
adivinhem... era eu

sábado, 27 de abril de 2019

MEU NACO DE CHÃO

Foto de Giancarlo M. de Moraes

Andei por pagos estranhos
por este mundo de Deus,
mas nenhum é como o meu,
onde deixei o umbigo.
É só aqui que consigo
viver bem a minha moda,
porque ninguém incomoda
e vivo rodeado de amigos.

Aqui tenho o meu rancho,
onde chimarreio cedo,
tenho a china e o piazedo,
todos em volta de mim.
Eu também cresci assim
com os pais e os irmãos,
num rancho de barro e chão,
com a quincha de capim.

Aqui enxergo mui longe
respirando o ar puro.
Aqui também me misturo
com este cheiro de pasto,
quando no campo eu passo
com um entono de galo,
escaramuçando o cavalo,
enforquilhado no basto.

Aqui me encontro com Deus,
o nosso Patrão Maior
e levo a vida melhor
do que muito homem rico.
Aqui me identifico,
neste meu pago farrapo,
onde herdei este naco
do meu Rio Grande bendito!

quarta-feira, 10 de abril de 2019

... DAS NOITES NO CAMPO

Foto de Giancarlo M. de Moraes

Em despedida o sol declina
levando o dia na garupa
e a noite chega num upa
por detrás do cinamomo
qual soberano no trono
destaca-se na paisagem
abrigando em sua ramagem
as aves que vem pra o sono

O campo espera o sereno
pra umedecer as cobertas
que a noite trará na certa
se o vento permanecer quieto
um universo de insetos
inicia sua labuta
no floreio da batuta
de um grilo desinquieto

Madrugada e um fio de lua
se confunde no arrebol
e o bigode do sol
refletirá nos retalhos
como a acender o orvalho
do cobertor campesino
prenunciando o matutino
como brasa no borralho

terça-feira, 2 de abril de 2019

ÚLTIMA CARREIRA

Foto autor desconhecido

Foi num domingo de maio
depois da Semana Santa
no bolicho do Tio Dantas
entre trago e fumaceira
que se ajeitou a carreira
do petiço com o cabano
que fechava cinco anos
procedente da fronteira

Se “acertemo” nas propostas
de tiro, peso e parada
se repartiu a indiada
uns contra outros a favor
Tio Dantas e o julgador
eu e o dono do gateado
“deixemo” tudo registrado
da baliza ao partidor

Até o dia da carreira
corria boato e mais boato
que o Nanico era pacato
e o Cabano um pilungo
na boca de todo mundo
o assunto era um só
mas pra desatar o nó
foi vinte e poucos segundos

O jóquei foi meu caçula
que também era nanico
e se embodocou quietito
no lombo do petiçote
como cobra deram um bote
tapando o outro na poeira
e “peleguiemo” a carreira
como quem dança um xote

Foi aquele alarido
dos que eram do meu lado
entraram no capinado
pra ir de encontro ao Nanico
com patacoadas e gritos
e até soltando foguete
e carregaram o ginete
o meu jóquei favorito

Correu com sobra de pata
o meu petiço Nanico
quebrando assim o bico
do gateado desafiante
e quem assume se garante
em cumprir conforme o trato
mas o outro “guspiu” no prato
e não me pagou o tratante

Me controlei pra exemplo
ao meu caçula na hora
achei melhor ir embora
antes de coisa pior
pois nosso Patrão Maior
será um dia o julgador
e com todo o Seu amor
nos dará algo melhor

Não sou de aparecer
nem tenho jeito pra isso
porém desfazer meu petiço
doeu na alma deste peão
e por detestar confusão
vou desistir de carreiras
pois tenho outras maneiras
de ganhar meu próprio pão