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quarta-feira, 29 de julho de 2020

DOMANDO A CIÊNCIA

No último dia de aula
antes das férias de julho
o piá se encheu de orgulho
com a nota da sabatina
uma nota bem acima
das outras que tinha tido
pois havia prometido
achar o filão na mina

A aula terminou mais cedo
nem chegou a ter recreio
e o piá louco de faceiro
andava lá nas alturas
a mais feliz criatura
alarife e pachola
como se o acontecido na escola
já fosse a formatura

Deu um tropelão pela estrada
escramuçando o petiço
pacholeava o piá magriço
embebido de alegria
botou tudo o que sabia
naquela folha de almaço
mostrando desembaraço
confiança e sabedoria

Com ares de autoridade
chegou em casa num upa
carregando na garupa
um entusiasmo ferrenho
sucesso no desempenho
e fibra de vencedor
como o mais hábil pintor
dá vida a um desenho

Da mãe abraço e beijo
e do pai um incentivo
o fato foi um estrivo
pra alçar a perna no estudo
e fazer que aquele miúdo
um dia dome a ciência
e que com toda a excelência
faça valer o “canudo”

sábado, 18 de julho de 2020

REFLEXO DO FULGOR

Foto de Marcelo Neves Pinto
O astro rei se despede

deixando o céu colorido

e uma nesga do fulgor

no açude refletido

terça-feira, 14 de julho de 2020

PLANTANDO UMA MORADA


Eu gostava do lugar
desde o tempo de piazito
era um recanto bonito
pra plantar uma morada
bem na volta da estrada
num sentado de campo
com o mato fazendo canto
contra a boca da picada

Cresci e comprei a terra
do filho do seu Totonho
para realizar o sonho
de quando era guri
fechei os olhos e vi
tudo bem como eu queria
e graças a Deus veio o dia
de fincar meu rancho ali

Comprei seis toras de angico
do mato do seu Felício
e falquejei a capricho
pra o rancho ficar de pé
mil feixes de santa-fé
tudo por uns vinte contos
e rolos de arame ponto
pra se amarrar como é

Fiz cacimba no olho d’água
com um carneiro que bate
pra garantia do mate
e a sede do bicharedo
no lado esquerdo o arvoredo
por causa dos temporais
e algumas plantitas mais
todas escolhidas a dedo

Um carreiro de cinamomo
uma baguala figueira
sombreando na mangueira
e um Tarumã no potreiro
Quero-quero e João-barreiro
galpão com fogo de chão
pra o churrasco e o chimarrão
e a prosa com os parceiros

Tá tudo como eu queria
só falta o coração
se domar numa paixão
e deixar de ser caborteiro
me despedir de solteiro
me amarrar com uma prenda
da cegonha uma encomenda
pra brincar no meu terreiro

quarta-feira, 1 de julho de 2020

NA TASCA DA TIA CATURRA



Nos sábados de tardezita
dou de mão na minha guitarra
pra me entreverar na farra
na tasca da tia Caturra
onde a gente se empanturra
de vinho doce e cachaça
e sacudindo a carcaça
se dança e se lava a burra

O gaiteiro é o Mão de Ouro
pra quem eu faço um costado
o Zé Rato turbinado
dá-lhe tapa num pandeiro
o Laranja no legueiro
dá paulada e se sacode
e o velho Chico Bigode
fumaceia um palheiro

As chinas se refestelam
balançando o recavem
dar carão nunca faz bem
é sinônimo de peleia
o sangue ferve na veia
num beijito traiçoeiro
onde a luz do candieiro
num canto pouco clareia

Na caixa a tia Caturra
não se descuida no troco
que pra ela sempre é pouco
pois por dinheiro é “chorona”
de sovina tem diploma
pós-graduação e mestrado
e ainda concluiu DOUTORADO
na Faculdade da Zona

Na copa o Grilo e o Toco
se desdobram no balcão
vez por outra um beliscão
num caneco alouçado
pra dar conta do recado
e da goela tirar o pó
e a Tia Caturra sem dó
com um olhar dá o recado

A noite vai se esvaindo
a madrugada se aproxima
o sono tenteia a china
que já tá embaixo “d’asa”
e o xiru aproveita a vaza
faz uma proposta no ouvido
daquelas que faz sentido
quando o corpo vira brasa

O sol chega de manso
junto com a última marca
então o xiru “acarca”
o apertão de despedida
na copa continua a lida
com o ritual da saideira
e a tia Caturra sorrateira
com a gaveta entupida