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segunda-feira, 5 de junho de 2023

JUCA TIGRE

 


Juca Tigre ganhou este apelido porque teve que viver refugiado pelos matos, na costa dos rios, por certo tempo.

Tudo começou de tardezita, por causa de um crime ocorrido num rincão desse nosso Rio Grande bagual onde  tinha chegado há poucos dias.

O filho de um homem rico, influente do lugar, depois de se aproveitar de uma menina de família pobre, achou por bem matar a guria.

Ah destino cruel! Logo correu o boato de que aquela barbaridade só poderia ter sido obra do tal estranho barbudo. A fofoca correu solta e ganhou força, inclusive instigada pelo verdadeiro autor.

Tão logo o Juca ficou sabendo de que estava sendo acusado, o que seria difícil provar ao contrário, resolveu fugir. Preferiu ser um fugitivo vivo que um inocente morto.

Montou um cavalo bueno que tinha e ganhou pra costa do rio.

Iniciou-se então, um voluntariado para ajudar a polícia. Todos queriam a cabeça do desconhecido.

Três dias depois do sepultamento, saiu uma patrulha a cavalo para fazer a busca.

Numa das escapadas fora do mato para chulear o movimento, Juca viu um cavalo que havia morrido há poucas horas. Astuto e inteligente arrancou da faca e cortou as quatro patas do animal, com canela e tudo, tirando também uns tentos da lonca. Levou para o esconderijo e lá riscou as canelas do morto de cima abaixo, tirando os ossos fora, mas deixando os cascos.

Com habilidade e conhecimento, confeccionou quatro botas e calçou no cavalo dele, que por sinal, o que tinha de bom, tinha de manso. Pensou num detalhe importantíssimo. 

Nas mãos ele calçou as botas das patas traseiras, com os cascos virados para trás e nas traseiras, colocou as botas das mãos do outro cavalo, também com os cascos virados. As botas todas costuradas com os tentos tirados da lonca. 

Serviço pronto e examinado, encilhou, deu uma cabresteada por dentro do mato para o animal se acostumar e esperou a noite chegar. 

Pegou a várzea, sempre costeando o mato, atravessou o rio e foi sair numa estrada do outro lado. Já quase clareando o dia  por ela se foi, não encontrando viva alma, por sorte.

Passava por algum rancho e apesar da cachorrada sair nele, ninguém abria a janela para uma espiada sequer.

No outro dia, já de tardezita, a patrulha andejava pela mesma estrada em que o Juca havia passado na madrugada e chegando num dos ranchos, indagou se não tinham visto um sujeito assim, assim e assim, dando as características do suposto criminoso. 

Ninguém soube informar nada, apenas um dos moradores disse que na madrugada passada ouviu os cachorros acoarem em alguém que passou na estrada e quando clareou o dia, viu que tinha rastro de cavalo em direção ao rio. A patrulha conferiu os rastros e voltou. Só podia, as botas do cavalo do Juca estavam com os cascos invertidos.

Anos mais tarde, apesar da melena tordilha, foi reconhecido num comércio de carreira, já com o cavalo sem as botas. Não foi preso, haja vista as provas que revelaram o verdadeiro criminoso, o qual ainda permanecia na cadeia.

Graças à justiça, a sua inteligência e astúcia, o sapateiro de cavalo viveu ainda muitos anos de bem com a sociedade, num rancho modesto, mas com dignidade.


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