Quando a ânsia de guri no meu peito corcoveia substituo a maneia por um bom par de esporas e me vou cego pra fora dando grito e manotaço para levar um abraço aos parceiros de outrora E ao avistar a porteira com a emoção me engasgo mas logo me entusiasmo e a alegria transcende a ânsia se desprende do palanque da saudade pra se tornar liberdade que quem é taura compreende Chego de sorriso largo como no tempo de moço e um maragato no pescoço que o vento cumprimenta mas o chapéu se sustenta nos tentos do barbicacho e esqueço aquele diacho que na cidade atormenta Então livre da maneia e calçado de esporas gaudereio campo afora como no sistema antigo e pelo corredor prossigo carregando os próprios passos que me conduzem ao abraço daqueles velhos amigos |
terça-feira, 8 de outubro de 2024
DESMANEADO
terça-feira, 1 de outubro de 2024
PRA QUEM JÁ FOI DE GALPÃO
Fim de tarde chegando a hora
da despedida do dia
boleia a perna a nostalgia
pra matear no coração
pois quem já foi de galpão
e se muda pra cidade
morre e não mata a saudade
daquela vida de peão
Saudade da faísca e da fumaça
e da brasa viva no tição
do calor do fogo-de-chão
e da cambona chiadeira
do café de chaleira
com uma boia de sal
que tinha gosto especial
ao rapar a frigideira
Na querência da cidade
emalado então me sinto
e a alma tem o instinto
de corcovear livremente
e a ânsia num repente
meu sentimento cutuca
pra fugir da "aripuca"
que sujeita este vivente
E com a nostalgia palanqueada
no tronco do coração
encilho o chimarrão
pra matear com as lembranças
e aquele tempo da infância
em um filme se apresenta
passando em câmera lenta
no qual me vejo criança
sexta-feira, 13 de setembro de 2024
DANDO RÉDEAS AO INTENTO
No sábado sempre é dia
de um banho com mais capricho
geralmente um cambicho
faz o taura mudar o cheiro
se embunitar ficar faceiro
dando rédeas ao intento
e se apresentar pacholento
pra dar um pealo certeiro
Uma encilha de respeito
e uma pilcha no traquejo
levando a ânsia e o desejo
que acumulou na semana
e a goela seca por cana
ou para alguma cantiga
que às vezes até lhe obriga
durante a "polka de dama"
O sábado finda ligeiro
quando a farra toma conta
e o domingo desponta
entre a fumaça e a poeira
e ainda na borracheira
e "ariado" das patacas
o taura leva a ressaca
pra curar segunda-feira
sexta-feira, 23 de agosto de 2024
NUMA DAQUELAS TARDES
Numa daquelas tardes ensolaradas de domingo de primavera, as nuvens de lã de ovelha bordavam o campo com suas sombras.
Pequenas flores dançavam aproveitando o ritmo e o assobio do vento.
Na estrada, a poeira de um solitário cavaleiro participava da dança.
Um bando de minúsculas aves surgiu lá no horizonte, e num voo irregular contra o vento, ficavam maiores ao passo que se aproximavam do açude onde as nuvens de lã se espelhavam e também projetavam as sombras.
Da frente do rancho, o pai vigiava a gurizada que num corre corre frenético, à beira d'água, manejava os caniços, vez por outra fisgando lambaris que reluziam ao sol.
Numa daquelas tardes, lá estava eu.
segunda-feira, 12 de agosto de 2024
AO TRANQUITO
Com as rédeas soltas
sobre as crinas cruzadas
ao passo na estrada
o taura se foi
e a velha carreta
de muitas jornadas
rodava cansada
seguindo os bois
E o sol declinando
no rubro poente
refletiu na corrente
da água do rio
levando o dia
pra mais um pernoite
e na boca da noite
a boieira surgiu
E o taura montado
vislumbrava a silhueta
da velha carreta
no jugo dos bois
de arreio sovado
prosseguiu noite adentro
e num tranquito lento
assobiando se foi
sábado, 22 de junho de 2024
DIA DE FOLGA
O Salvador cheio de amor
encilhou o baio e foi pras gurias
O Ademir não quis sair
tava de luto por perder a tia
e o Ademar saiu pra tentear
a filha solteira da dona Maria
O Natalício tratava do vício
esfarelando fumo na palma da mão
o velho Pedro contava nos dedos
quantos dias trabalhou de peão
e o Diogo armava o fogo
pra mode assar um capão
O Altivo já com o pé no estrivo
sentia a ânsia do fim de semana
o Honorato com mais três ou quatro
deram o fim no garrafão de cana
o Santiago se passou no trago
e estirado dormia na grama
terça-feira, 18 de junho de 2024
PACHOLEANDO
Uso pilcha porque gosto
e não pra fazer agrado
trago isto por legado
e é assim que eu penso
pois neste Rio Grande imenso
meu avô peleou pilchado
com Ideal Colorado
simbolizado no lenço
E foi por causa deste lenço
atado no meu pescoço
que fui chamado de grosso
no meio dos cola fina
mas dei a volta por cima
sem usar os meus "talher"
e com meu tino por mulher
fiquei com a mais linda china
(Poesia batizada pelo meu amigo Arleo Puccini Cezar)
sexta-feira, 24 de maio de 2024
FORTE E GUAPO
Cousa braba meu Rio Grande
esta enchente que te afoga
mas coragem tens de sobra
demonstrada nas peleias
e o teu povo não se enleia
porque é forte e guapo
trazendo o Sangue Farrapo
caudaloso em suas veias
quarta-feira, 22 de maio de 2024
GAUDÉRIO
Levaram o Chico Ruivo!
Assim correu a notícia,
foi preso pela polícia,
lá no bolicho do Gringo.
Disseram que foi sorrindo
no meio de dois soldados,
de cavalo cabresteado
numa tarde de domingo.
E foi também num domingo,
que apareceu o tal cuera.
Não se sabia quem era
e por ninguém conhecido.
Tinha um olhar atrevido,
em se tratando de china
e a cor de bronze na crina,
que lhe forjou o apelido.
Deixou um herdeiro no ventre,
de uma chinoca crinuda,
de apelido Topetuda,
biscateira e separada,
deixou uma égua bragada,
que ficou sem ter serviço
e em conta no bolicho,
uma pistola empenhada.
sábado, 27 de abril de 2024
O PEALO DO AMOR
O taura num fim de semana
saiu pra golpear uma cana
e retoçar num surungo
com um talagaço no liso
se sentiu no paraíso
quando a gaita deu um resmungo
Depois de uns sambas com Fanta
pescoçeou uma percanta
e saiu pedindo cancha
dando conta do recado
num xote bem figurado
pois era herdeiro da dança
E era dele a bolada
com a percanta amorenada
e no cabelo uma flor
tinha um olhar de lua
que o taura não recua
e se desmancha em amor
Um cochicho no ouvido
foi logo correspondido
com um olhar de malícia
e o taura que não era bobo
sentiu estar ganho o jogo
e amiudou as carícias
Com mais uns sambas com Fanta
e a conquista da percanta
sentiu-se dono do mundo
e o amor com seu embalo
no taura deu um pealo
no retoço do surungo
Depois tinindo as esporas
levou a percanta embora
quando o dia amanheceu
e por aquele olhar de malícia
que aguçou as carícias
mais um rancho se ergueu
terça-feira, 16 de abril de 2024
VOVÓ BELA
"Larguem de ser tolos miúdos"
dizia a vovó pra nós
com forte exaltação na voz.
Porém depois do sermão,
nos acariciava com a mão.
Hoje lembro a Vó Bela,
sentada na banqueta dela
socando arroz no pilão.
Um relho cabo comprido
tinha sempre bem à mão,
pra espantar a criação
que em sua volta alardeava,
com os cachorros ralhava
quando chegava alguém,
a todos fazia o bem
e lindos causos contava!
De noite depois da janta,
sentados perto do fogo,
na hora alegre do jogo,
de baralho ou de pausinhos,
a vó com muito carinho
e moderação na fala,
dava um punhado de balas
pra os da casa e os vizinhos.
Quando chegava o sono
e a gurizada boleava,
a vovó Bela arrumava,
pra cada um uma cama
e com postura de dama,
depois do Sinal da Cruz,
agradecia a Jesus
e do lampião soprava a chama.
Saudade minha Vovó Bela,
é a herança que tenho.
Lembro tu como um desenho
bem bonito e colorido,
também lembro do vestido
que nos domingos usavas
e no espelho te olhavas
com o cabelo "lambido".
As travessuras do passado,
ficaram pra trás no tempo
e hoje quando me sento
em frente ao teu retrato,
vejo um rosto sensato
me olhando com um sorriso,
com o teu cabelo liso,
vem a saudade de fato.