Páginas

Marcadores

domingo, 8 de abril de 2012

TIO OLAVO




Tava branqueando a melena
do negro velho Olavo
era filho de escravo
mais velho que a galena
a pele mais que morena
tisnada pelo sol quente
tinha um sorriso contente
no rosto daquele idoso
brotando voluntarioso
na brancura dos seus dentes

O galpão seu parador
com os pertences e o cachorro
tendo os pelegos de forro
e o pala por cobertor
de lençol o tirador
de travesseiro o lombilho
não sabia mais dos filhos
depois que a mulher morreu
mas nem por isto perdeu
dos olhos pretos o brilho

Erva buena sempre tinha
e a costela na brasa
passava em volta da casa
dando boia pras galinhas
apartava alguma rinha
varria bem o terreiro
fumaceava um palheiro
preso no canto da boca
e cantava com voz rouca
sacudindo um pandeiro

No campo pra dar um passeio
às vezes lhe apetecia
ver as vacas com suas crias
tirar o mofo do arreio
no cavalo dar um floreio
e uma arrastada no laço
sentir no rosto o mormaço
daquele sol de janeiro
e o cachorro companheiro
na sombra do seu picaço

Mas num passeio à tardinha
tio Olavo se deu mal
parecia um bagual
o picaço quando vinha
só se via a carapinha
do negro já sem chapéu
foi aquele escarcéu
e todo mundo corria
nem rezando a ave maria
se escapou do boléu

Acudiram o coitado
mas já estava lá no céu
todos tiraram o chapéu
e um pai nosso foi rezado
avisaram no povoado
da morte do pobre peão
mandaram chamar o irmão
fizeram bombacha nova
depois cavaram uma cova
de sete palmos no chão

Conforme havia pedido
foi de lenço colorado
pra no céu chegar pilchado
quando fosse escolhido
queria estar prevenido
lá na querência divina
e assim de relancina
se viesse a ele o lampejo
de um mate e junto o beijo
no encontro com sua china

O luto cobriu o galpão
e silenciou o pandeiro
ficou o toco do palheiro
se desmanchando no chão
a banqueta no oitão
triste lá fora ficou
o picaço se quebrou
em consequência do susto
morreu o pobre do cusco
e o pai-de-fogo apagou

Nenhum comentário:

Postar um comentário